Nesta terça-feira, 29 de março de 2016, a sala de teatro do CCL em Americana ganha o nome de Carmela Canciani, grande estrela dos primeiros palcos de Americana (ou do primeiro palco!). Esforço do vereador Celso Zoppi, do pesquisador Gledes Alcalá e de talvez outros amigos e familiares de Carmela que eu não saberia citar. No governo do ex-prefeito Diego De Nadai a proposta foi levada para a prefeitura, mas por motivos escusos o governo recusou dar à sala o nome de Carmela. Motivos políticos? Pessoais com os autores da proposta?? Provável... Mas agora a homenagem mais do que justa foi sacramentada pelo atual governo do prefeito Omar Najar.
A seguir, alguns depoimentos de americanenses que conheceram, conviveram ou atuaram com Carmela, seguido de um texto resumo da sua trajetória. Sempre é bom conhecermos as figuras ilustres que nossa cidade gerou!
“Nunca se ouviu sobre alguém na cidade que tenha desenvolvido tamanha dedicação pela arte de representar como fez Carmela, numa época que tudo era muito difícil de conseguir. O preconceito era marcante para as mulheres que queriam ser atrizes. Foi esse preconceito e tantas outras barreiras na época que impediram Carmela de alçar vôo para os grandes palcos da capital ou novelas de TV. Hoje seria lembrada ao lado de grandes nomes que brilham nesse país. Mas para nós ela vai brilhar em nossas mentes, em nossas recordações como nossa grande estrela. Só nossa!!!"
Airton Sgobin – amigo
“Carmela Canciani, de coração grande e generoso, procurava não somente fazer, mas também transferir cultura. Abnegada, fazia da arte um instrumento de religiosidade para o povo."
Antonio Carlos Duarte (Grilo) – amigo
“Tive a honra de trabalhar com Carmela por 25 anos. Mulher de muitas qualidades, destaco algumas: organizada, honesta, leal e dedicada. Trabalhava muito e amava seu trabalho. Não reclamava de nada, era simpática, humilde e inteligente. Sua dedicação e lealdade foram extremas e poucas vezes na vida se vê parecidas."
Dr. Eliel Barreto Cezar – patrão e amigo.
”A escola de Carmela foi o Monsenhor Nazareno Magi. No Palco dava um
show de talento, demonstrava grande profissionalismo. Pessoa amiga e amável, no
teatro, nos passeios e na vida.”
José Fernandes Filho – amigo
“Carmela, seus exemplos de vida, suas atividades pessoais, seu amor ao próximo, sua união às boas causas, tudo isso transformou você em uma criatura que deixou saudades."
Hércule Giordano – cunhado (in memorian)
“Carmela viveu e lutou pelo teatro, usando-o para a divulgação do cristianismo.”
Adauto Reami – amigo
“Carmela foi uma pessoa especial para todos os amigos. Pioneira na arte
do teatro em Americana, mulher muito à frente do seu tempo”.
Lena – amiga
“Tia Carmela foi a mais divertida e engraçada de todas as minhas tias,
ajudou na minha criação e na minha educação, me ensinou muitas coisas. Não cheguei
a vê-la tocar sanfona, seguramente uma de suas mil facetas engraçadas. Mulher
bonita e vaidosa, possuía cremes, perfumes e batons cor-de-rosa sempre aos
montes. O esmalte era sempre o mesmo: rosa-rei. Enfim, nem o amargo gosto do
diabetes, que a levou, conseguiu tirar a doçura dessa mulher encantadora. A tia
mais jovem partiu primeiro, seus cabelos loiros iguais aos meus....quantas
saudades!!!!”.
Dra. Camila Canciani – sobrinha
A ARTISTA QUE FEZ AMERICANA RIR E SE EMOCIONAR
CARMELA CANCIANI, a mais
talentosa atriz, produtora e diretora teatral que Americana viu e admirou.
O patriarca Felício Cancian, quando da chegada ao Brasil, vindo de
Treviso, norte da Itália, teve seu sobrenome registrado errado na imigração de
Santos e assim em Canciani se transformou. Chegou no Brasil em 1894 e foi com a
família para a cidade de Rio das Pedras. Como chegou criança, lá se criou e lá
também se casou com a italiana Amábile Nicoletti, tendo sempre estado na lida
com a cultura do café, primeiro na Fazenda Palmeiras e depois na Fazenda Monte
Carmelo.
Durante o governo do Presidente Vargas, com a quebra da cultura do
café, o casal Felício e Amábile Canciani foi para a cidade de Salto, por um
curto período e depois vieram viver em Carioba com seus onze filhos, três
homens e oito mulheres.
Uma delas com o divino poder de divertir, artista nata, nunca fez
curso algum relacionado ao teatro: CARMELA CANCIANI, que estudou somente até o
4º ano primário no Grupo Escolar Comendador Muller, em Carioba, porém possuía
imaginação privilegiada e a arte de produzir, dirigir, interpretar e improvisar
estava em suas veias.
Quase todos os Canciani trabalharam na Fábrica de Tecidos Carioba,
de propriedade dos Müller e depois dos Abdala. Carmela com toda a sua
inspiração pela arte, uma profunda paixão pela família e com uma grande
religiosidade e humildade, trabalhou como urdideira.
O tempo passou e a família se mudou para a Rua Benjamin Constant,
no centro da cidade, onde estão até hoje. Alguns dos irmãos foram trabalhar
como autônomos, outros mudaram de serviço e de patrões. Alguns se casaram,
outros permaneceram solteiros, assim como Carmela.
Na década de 1950 Carmela Canciani convida alguns amigos e amigas
e assim começa a carreira no teatro amador, quase sempre usando o palco do
salão de festas da Matriz de Santo Antonio.
Carmela, que produzia, dirigia e representava, gostava do teatro
bem feito, com ensaios sem fim. Com todo esse lado voltado para a cultura,
encontrava tempo para se dedicar à vida profissional, indo trabalhar de
secretária para o conhecido cardiologista Dr. Eliel Barreto Cezar, onde
trabalhou praticamente até o final da vida.
A atriz de voz possante, montou, dirigiu e representou dezenas de
vezes a Vida, Paixão e Morte de Jesus, que mesmo sabendo-se como começava e
como terminava, sempre emocionava o americanense e por diversas vezes
interpretou cantando o belíssimo lamento de Verônica. Em todos os ensaios e
apresentações, lá estava o Monsenhor Nazareno Magi que sempre incentivava e
estimulava o grupo de teatro da Matriz de Santo Antonio, grupo liderado por
Carmela que com arte, zelo, capricho, brio e dignidade ensinou a tantos a arte
de interpretar, a abrir os horizontes da cultura usando o palco. À maestria da
artista o povo sabia corresponder com intermináveis aplausos. Ela e seu grupo
também se apresentavam em outras cidades além de Americana.
Entre dramas, comédias e peças infantis, são algumas entre tantas:
Holofernes ( A História de Judite), As duas Mamães, As Galinhas da Tia Chica,
Dona Xepa, Deus dormiu lá em casa, A pena e a lei, Auto da Compadecida, O boi e
o burro a caminho de Belém, O reizinho mentiroso, A raposa e as uvas, Universitário
morre as oito, Entre dois corações maternos, As cegas de Kion e Kiang, Os sete
passos da juventude sem amor. A peça Alzira Power foi ensaiada, porém foi
censurada e aconselhada a não ser apresentada.
Os painéis que compunham o cenário, maravilhoso e admirado por
todos, Carmela solicitou que os artistas Alberto Gobbo e Pietro Gentili os
pintassem , sendo uma verdadeira preciosidade e uma grande obra de arte.
As peças teatrais lideradas por Carmela, sempre eram pensadas nos
mínimos detalhes: cenografia, iluminação, contra-regra e os efeitos sonoros e a
sonoplastia eram quase reais, onde se andava a gravar o apito do trem na velha
estação, o latido de um cachorro, o badalar dos sinos, o apito da fábrica, o
som do trovão, que era conseguido agitando uma folha de zinco, enfim, tudo
parecia real.
Carmela era tão profissional e perfeita na arte de representar que
não passou despercebida aos olhos da TV Tupi, que veio lhe procurar e ofereceu
um contrato como atriz na TV mais importante da época. Carmela não aceitou para
não se afastar da família, pois entre eles havia uma união fortíssima. Talvez
não tenha aceito também, como relata uma de suas irmãs, pelo fato de nos anos
60, 70 e 80 a maioria das artistas da televisão eram do teatro rebolado, visto
com reprovação por todos aqueles que haviam tido uma forte educação religiosa,
como todos da família Canciani, da qual posso dizer com segurança, todos
tiveram a vida direcionada para o bem.
Posso também dizer, Carmela foi a primeira e mais perfeita atriz
que Americana teve, sua genialidade e alegria serão difíceis de encontrarmos em
outra pessoa, Carmela vivia intensamente a arte de representar.
Pesquisa de depoimentos e texto: Gledes Alcalá.
Fotos: acervo da família Canciani
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