sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

A cruz da Matriz e os políticos de Americana

Escreveu monsenhor Magi à Câmara Municipal de Americana em 1958:

“É notável que só a Câmara Municipal de Americana, singular e isoladamente, enxergue os problemas diferentes das demais Câmaras Municipais do país, inclusive dos legislativos das capitais e das Assembléias como também do Congresso Nacional. Não parece concebível que os delicados escrúpulos de consciência constitucional seja privilégio exclusivo de nossa egrégia Câmara, que vem se apegando alguns nobres vereadores.
            Por acaso será nossa digna Câmara mais constitucionalista e mais legalista do que nossa Assembléia Legislativa?
            Aqui são 15 nobres edis municipais, lá são 75 nobres deputados estaduais, mesmo assim, com essa proporção, haverá em nossa colenda Câmara Municipal juristas em maior número e mais constitucionalistas e legalistas do que em nossa conspícua Assembléia?
            Em nossa egrégia Câmara de vereadores se vê inconstitucionalidade onde a nossa Assembléia enxerga constitucionalidade. Nossos políticos visam os interesses dos nobres edis que agem a favor ou contra as aspirações da população local, se os intuitos eram ou não eram do povo.
            Senhor Presidente, se a existência das Câmaras Municipais não decorre de outros princípios senão do político, dado o nosso regime representativo definido em nossa Constituição em que proclama que “Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido”, como poderá haver projetos de leis que não sejam políticos, quando a política é a arte de bem governar pelo bem do povo, através dos poderes que o povo confere a seus representantes?
            Para esta elevada finalidade é que existe o poder legislativo municipal, estadual e o Congresso Nacional, e para esse fim é que são eleitos os nobres vereadores pelo povo, competindo-lhes os justos anseios da coletividade, consultando as aspirações do povo que os honrou como seus mandatários, estudando e deliberando os problemas do povo e ascoltando-lhes os sentimentos sempre que forem representados à apreciação do corpo legislativo competente, nada importando se os projetos, aspirações e sentimentos oferecidos à deliberação dos seus legisladores procedem deste ou daquele representante, deste ou daquele partido político, seja da situação governista ou da oposição ao governo.
            O dever democrático, constitucional e legal dos vereadores é deliberar com serenidade a matéria, se é útil ou nociva ao povo, aspirada ou repelida pelo povo, a quem tem que prestar contas, abstraindo-se qualquer disposição pessoal ou partidária.
            A Câmara Municipal como a nossa, deve distinguir perfeitamente se um projeto de lei colocado à sua apreciação tem interesse político, ou interesse dos políticos, isto é, dos dignos representantes da polis, do povo, encarando patriótica e democraticamente os desejos do povo acima de qualquer indisposição subjetiva, pois do contrário haveria simplesmente arbítrio de um partido dominante, que só entende como o povo, os interesses que venham de seu grupo ou que só atendem projetos desde que não se critique pela imprensa, os vereadores, ocasionando assim danosas conseqüências à democracia, porque deste modo se estabeleceria privilégio indevido de grupos partidários eventualmente ocupantes do poder em detrimento da cidade que está sob a égide de seus políticos, sujeitos à crítica de todos.
            A nossa distinta Câmara de vereadores encontra motivos não convincentes e inaceitáveis, é frustrada em suas aspirações.
            Certo ou errado cada um dos nossos ilustres e dignos políticos, correspondendo ou contrariando os anseios da população, manifesta-se como bem lhe parece. De qualquer modo, fique ao povo a experiência da lição deste triste exemplo, advertindo aos cristãos fiéis, como devem no futuro, eleger representantes de seus interesses, de seus ideais e sentimentos, políticos que comunguem também sinceramente de seus elevados princípios religiosos.
            Tributando meus profundos e sinceros sentimentos de respeito, estima e consideração à Vossa Excelência Sr Presidente, bem como a nobre e colenda Câmara Municipal de Americana, peço a Deus as mais eleitas bênçãos sobre os nossos Vereadores Municipais  e que a todos venha a luz no seu árduo e benemérito dever político, visando o bem geral e satisfação da comunidade americanense.
            Atenciosas e cordiais saudações”.
            Assina o Monsenhor Nazareno Magi.
            29 de janeiro de 1958.


Esta carta, fruto de pesquisa do historiador Gledes Alcalá, foi em resposta à Câmara Municipal de Americana, pela negativa dos vereadores da época, em custear com uma pequena verba publica a iluminação do ponto mais alto da cidade naquela época, que era a cruz existente no alto da torre da Nova Matriz de Santo Antonio.

CONHECENDO A HISTÓRIA:
A iluminação da cruz da torre da Matriz foi proposta pelo vereador Gildo Boer em 21 de maio de 1957, sendo presidente da Câmara o Sr. Nicolau João Abdala.

Em 13 de dezembro de 1957 foi finalmente rejeitado após intensas discussões. Votaram favoráveis à iluminação do cruzeiro os vereadores: Dirceu Cunha e José Paciulli. Votaram contra os senhores vereadores: José R. Azenha, Oscar Ignácio de Souza, Romeu Benotto, Plínio Bonin, Alcindo Dell’Agnesi, Odaly Ortolano e Orlando Dei Santi. O vereador Cidélio Medon se declarou impedido e estavam ausentes do recinto o Gildo Boer e Chalil Zabani.

A ata de votação não faz nenhum comentário quanto aos votos de Oswaldo Miante, Rogério Camargo Neves e Antonio Pereira Leite.

O pesquisador Gledes Alcalá considera a carta escrita em 1958 pelo Monsenhor Nazareno Magi, perfeitamente cabível para os dias atuais. O religioso era realmente um critico político e um visionário.


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